quarta-feira, 30 de setembro de 2009

A função do Coro na Tragédia Grega

Texto baseado na fala do Prof. Antonio Medina Rodrigues, professor de Língua e Literatura Grega da USP, tradutor, ensaísta e poeta, durante palestra do dia 28 de setembro de 2009, no espaço do SESI/Paulista.

A tragédia grega é um dos gêneros mais nobres do teatro, o que acumula mais sabedoria, dada sua tradição. Etimologicamente remete ao canto do bode (sacrifício), ato que era assistido por pessoas que se colocavam num raio circular de 10 m2. Aqueles que ficavam fora do círculo, sentavam-se sobre pedras ou se encostavam nas rochas, caracterizando os momentos primórdios do cenário atual.
O sacrifício do bode era uma analogia ao massacre de Dionísio, originário da Ásia, Deus carregado por um lado irracional e impulsivo, oposto à Apolo (sec. XVIII e XVII a.C.)
O teatro se iniciou com um único personagem em cena, passando para dois e para três (Eurípides: coro). Assim, a constituição do homem se marca pelo número três, e não o dois (aliás, número em torno do qual se constrói toda a obra Divina Comédia, de Dante Alighieri)
Quando surge o coro, sua manifestação se dá pela fala, pela dança e pelo canto (parte poética do teatro grego é cantada), passando, com o tempo, a contar com doze atores (em dois grupos de seis). Naturalmente, com a evolução dos textos teatrais, muda também a função do coro. Sua finalidade inicial era a de alegrar o espetáculo teatral falado, posteriormente, passa a ter um papel narrativo.

O Coro nas peças (diferentes funções):
- ORESTES: quase não possui o coro (não tinha papel na peça), contudo, foi a principal peça grega depois de Édipo Rei (onde o coro lamenta a situação da cidade).
- AS BACANTES (Eurípides): uma presença marcante do coro, narrando a estória de milhares de mulheres (mênades) embriagadas pelo Deus Dionísio. A função do coro nesta peça era a representação da vontade popular a caminho da contestação do poder.
- PROMETEU ACORRENTADO: presença de um coro de mulheres (oceaninas), filhas do Deus Oceano, que lamentam a situação de Prometeu.
- ÉDIPO EM COLONO: o coro é agressivo, ataca Édipo (já em idade avançada) como um assassino.
- MEDEIA: o coro é pobre, pois com Medeia não há diálogo, já que sua fala é pré-concebida e fechada. FEDRA acentua a loucura de Medeia, representante de um completo descontrole da alma.
- OS SETE CONTRA TEBAS: o coro tem a função de resolver dilemas de sangue (os dois filhos de Édipo não se suportam, um termina por matar o outro).

O principal tema do coro era o esfacelamento das cidades, aliás, esse tema era o grande terror do povo grego. O coro fala de temas elevados, quando há a necessidade de uma linguagem baixa, um personagem (Corifeu) sai do coro para fazê-lo. Aristóteles considerou a importância da catarse para o público, assim, a peça deveria causar o horror e a piedade, para que os sentimentos fossem purificados.
Ésquilo, Eurípedes e Sófocles são os principais escritores da tragédia grega, sendo Aristófanes o maior comediógrafo. No mundo ocidental moderno, William Shakespeare é o grande nome do teatro, tendo escrito, entre outras peças, Hamlet, Otelo e Macbeth. Na França, Racine e Molierè prosseguiram com a tradição teatral.

ÉDIPO REI:
CORO: Ai de nós, sem conta são nossos sofrimentos! O povo doente, impotente o nosso espírito, fenecem os frutos da terra e as mães gemem estéreis; vidas a irem-se embora, como pássaros leves, mais céleres que o raio vibrado pelos céus, para os confins da noite...
Despojada de seus filhos, a cidade perece, e, sem quem os vele e sem uma única lágrima, jazem os corpos pelo chão, espalhando o contágio; as viúvas e as mães encanecidas, nos degraus dos altares, enchem os ares de lamentos pungentes por tanta desventura, a que se fundem lúgubres cânticos. Dileta filha dourada de Zeus, envia-nos teu auxílio!

sábado, 26 de setembro de 2009

A Literatura em Perigo (Tveztan Todorov)

Hoje, se me pergunto por que amo a literatura, a resposta que me vem à cabeça é: porque ela me ajuda a viver. Não é mais o caso de pedir a ela, como ocorria na adolescência, que me preservasse das feridas que eu poderia sofrer nos encontros com pessoas reais; em lugar de excluir as experiências vividas, ela me faz descobrir mundos que se colocam em continuidade com essas experiências e me permite melhor compreendê-las. Não creio ser o único a vê-la assim (...) Ter como professores Shakespeare e Sófocles, Dostoievski e Proust não é tirar proveito de um ensino excepcional? E não se vê que mesmo um futuro médico, para exercer o seu ofício, teria mais a aprender com esses mesmos professores do que com manuais preparatórios para concurso que hoje determinam o seu destino?

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Entrevista com Teolinda Gersão - Dia do Escritor

Trechos preferidos I

"Porque ela era tão forte que aguentaria qualquer nota errada ou falsa, tão forte que aguentava repensar o mundo, sem medo de se enganar entre certo, errado e falso? É que tem de haver outro modo de criar o mundo, soube, porque havia de repente uma força subindo, dentro dela, uma fonte inundando por dentro o seu corpo, como água correndo no deserto, descendo até a profundidade cega e funda das raízes. E porque ela era forte e ele era frágil, porque ela era água correndo e ele vazio e pedregoso, ela podia arrastá-lo consigo, soube ainda, caminhando descalça no tapete e descrevendo em volta dele um círculo estreito, cada vez mais estreito, chegaria a um ponto em que ele não se defenderia mais e deixaria para trás o seu mundo como invólucro abandonado. E então ela abriria a janela e deixaria entrar o mar, os monstros, as medusas, as sereias, e seria ela própria monstro, sereia, medusa, abraçando-o com os seus mil braços e levando-o consigo para a profundidade do mar."

Romance "O silêncio" de Teolinda Gersão

Trechos preferidos II

"(...) eu não existo, mundo, não existo, sou apenas uma folha de árvore, uma pena de pássaro, um qualquer objecto leve balançando ao sabor do vento, sem rumo próprio, sem vontade, sem peso, não ajo, não desejo, não tenho finalidade, nada mais quero do que ficar aqui, sem ser agredida, enquanto durar este minuto - mas sempre de novo o mundo rebentava esse instante, sempre de novo recomeçava a luta, e o mundo ganhava , ganhava sempre, contra ela..."

Romance PAISAGEM com mulher e mar o fundo de Teolinda Gersão

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Trechos preferidos III

Acordar de noite e lutar contra o mar. Impor, sobrepor, a minha voz à sua. Acima do seu canto o meu grito, mais alto que a sua música a minha raiva, o meu choro, a minha discordância. Atirar pedras, facas, contra o mar. Fechar contra ele todas as portas e janelas. Contra o seu infinito a minha finitude. Partir o mar como se fosse um espelho.

Romance PAISAGEM com mulher e mar ao fundo de Teolinda Gersão

segunda-feira, 21 de setembro de 2009


Leandro Moura nasceu em São Paulo, Capital em 1976. Graduado em Letras, pós-graduando, atua como professor de línguas e literaturas portuguesa e inglesa, e redação nas redes públicas e particulares. Publicou contos e poemas, neste livro "À espera dos frutos", "Estrela Esperança" e "Paro e Penso".

Literatura Portuguesa Contemporânea


Entre os escritores da Literatura Portuguesa Contemporânea encontra-se Teolinda Gersão, cuja obra dialoga com o período histórico recente de Portugal e com as consequências e valores que se refletem na sociedade. Muito mais do que uma literatura engajada, trata-se de uma busca do ser humano consigo mesmo, da necessidade de atuar no seu mundo, que na verdade, não é um mundo apenas partilhado, mas compartilhado por cada um de nós. Em sua prosa, vai se tecendo uma intensa linguagem poética, que marca e caracteriza a sensibilidade da autora.
A metalinguagem presente no texto não se limita à arte da escrita, mas demonstra como a repetição de um discurso que se move por interesses políticos e econômicos nos conduz ao silêncio.